Entre as justificativas apontadas para a queda do parlamentar, estão perseguição de inimigos com requerimentos, contratação irregular de empresa de espionagem, alterações de leis para beneficiar banqueiros e a si próprio, entre outras
Eduardo Cunha em agosto de 2015 (Foto: AP Photo/Andre Penner)
Em seu pedido de afastamento do presidente da Câmara dos deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ), a Procuradoria-Geral da República listou 11 práticas do deputado para “embaraçar e impedir a investigação” contra ele na Lava Jato e na Comissão de Ética. O parlamentar é acusado de perseguir os seus adversário com requerimentos de quebra de sigilo,
cobrar propina para liberar dinheiro do FI-FGTS e favorecer banqueiros e empreiteiros com medidas provisórias. Por essas razões, é imperioso que a Suprema Corte do Brasil garanta o regular funcionamento das instituições, o que somente será possível se, pelo menos e neste momento, adotada a medida de afastamento do Deputado Federal Eduardo Cunha do seu cargo de Deputado Federal e, ainda, das suas funções de Presidente da Câmara dos Deputados”, diz o documento da PGR.
Confira abaixo os principais capítulos:
Alterações de leis
Recentemente, o deputado Heráclito Fortes (PSB-PI), aliado de Cunha, apresentou o projeto de lei nº 2755/2015 para impedir que um colaborar corrija ou acrescente informações em depoimentos prestados. Foi exatamente o que fez Julio Camargo. Após várias oitivas, o lobista confessou que Cunha cobrou R$ 5 milhões em propina. “A alteração legislativa proposta confere uma ‘segurança jurídica’ aos criminosos que bastarão ameaçar e intimidar os Colaboradores até a ‘primeira oitiva’. Após esse momento, não poderão alterar ou corrigir as informações, ainda que tenham um motivo relevante para tanto”, afirma a PGR. O presidente da Câmara determinou que o projeto de lei tivesse “apreciação conclusiva” pelas Comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado e pela Comissão de Constituição e Justiça. Ou seja, com a anuência dessas comissões, nas quais Cunha conta com a maioria de aliados, o projeto não precisaria ser submetido à votação pelo plenário. O parlamentar do PMDB também tentou, por meio de seus aliados, emplacar o Projeto de Lei 2.960/201, assinado pelo deputado Manoel Júnior (PMDB-PB) – que poderia eximir Cunha da responsabilidade pela manutenção de valores não declarados no exterior. O PSDB, porém, incluiu uma emenda para proibir a adesão ao programa de servidores e seus familiares.
Favorecimento a banqueiros
Investigadores encontraram documentos que apontavam indícios da atuação de Cunha na aprovação de medida provisória para favorecer o banco BTG Pactual, que doou R$ 500 mil para a campanha do parlamentar. Citando reportagens jornalísticas sobre o relacionamento entre o presidente da Câmara e a instituição financeira, a PGR afirma: “Há indícios da participação de EDUARDO CUNHA, direta ou indiretamente (por meio de interpostos parlamentares aliados dele) medidas provisórias, apresentando emendas que visavam favorecer os bancos em liquidação e, mais especificamente, ANDRE ESTEVES: (i) MP 472; (ii) MP 517, (iii) MP 561; (iv) MP 510; (v) MP 627; (vi) MP 608; (vii) MP 668; (viii) MP 627; (ix) MP 675; (x) MP 651 e (xi) MP 688. Ademais, verificou-se que EDUARDO CUNHA teve reunião com o Advogado-Geral da União visando forçar uma interpretação jurídica que favoreceria os Bancos liquidados (em especial as instituições financeiras que os adquiriram), mas que não foi aceita. Não bastasse, e-mails trocados demonstram que EDUARDO CUNHA atuou como longa manus dos Bancos, protegendo os interesses ilícitos destes em detrimento do interesse público, visando, assim, receber vantagens indevidas”.
Requerimentos contra o lobista Julio Camargo
Devido ao atraso nos pagamentos da propina decorrente de contratos assinados entre a Samsung e a Petrobras, o lobista Fernando Baiano pediu a ajuda de Eduardo Cunha para cobrar Julio Camargo, que representava a empresa coreana no Brasil. O parlamentar apresentou dois requerimentos na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados (CFFC), exigindo informações sobre o grupo Mitsui e Camargo. “Apurou-se que os arquivos dos requerimentos n. 114/2011 CFFC e do requerimento n. 115/2011 CFFC, constantes do próprio sítio da Câmara dos Deputados em formato pdf, efetivamente registram em seus metadados, no campo autor, ‘Dep. Eduardo Cunha’”, diz a PGR. Camargo prometeu quitar a sua dívida com fretamento de aeronaves para o parlamentar entre agosto e setembro de 2014 por meio das aeronaves com prefixos PP MIS e PR JET2.
Grupo Schain
Após o rompimento da barragem da Pequena Central Hidrelétrica (PCH) de Apertadinho, em Rondônia, em 9 de janeiro de 2008, iniciou-se uma verdadeira guerra empresarial e política. A CEBEL, responsável pela unidade e ligada à Lúcio Bolonha Funaro, responsabilizou a Schain Engenharia, que tocava a obra. “Imediatamente após a disputa entre FUNARO e SCHAHIN surgem dezenas de requerimentos no Congresso Nacional, patrocinados por EDUARDO CUNHA e seus correligionários”, diz a PGR. Entre 2008 e 2015, foram mais de 30 medidas contra a Schain, segundo levantamento dos investigadores. Somente na CPI da Petrobras, instaurada neste ano, a companhia e seus familiares foram alvos de pedido de quebra de sigilo dos deputados Arnaldo Faria de Sá e Altineu Cortês. A proximidade entre Cunha e Funaro é exemplificada em ao menos dois veículos carros em nome da empresa C3 produções Artísticas e Jornalísticas, de propriedade de Cunha e a sua esposa, Cláudia Cruz. Os automóveis Land Rover Freelander, placa DWN 5512, foi adquirido com um cheque da empresa Cingular Fomento Mercantil, no valor de R$ 50.0000, depositado em maio de 2012, e outro cheque da empresa Royster Serviços, no valor de R$ 50.000. Já o Hyundai Tucson, placa EGG 1872, foi pago pela Cingular Fomento Mercantil, no valor de R$ 25.000, depositado em fevereiro de 2012, e uma TED em nome da Dallas Agentes A. Investimentos, em abril de 2012, no valor de R$ 55.000. As empresas Cingular, Royster e Dallas são ligadas a Funaro. “Tais elementos demonstram que LÚCIO BOLONHA FUNARO, direta ou indiretamente, pagou veículos no valor de pelo menos R$ 180.000,00 em favor da empresa de EDUARDO CUNHA”, afirma a PGR.
Beatriz Catta Preta
Na CPI da Petrobras, Eduardo Cunha teria utilizado a sua relação com o deputado Celso Pansera (PMDB-RJ) para convocar a advogada Beatriz Catta Preta, que tinha como clientes os delatores Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco, Augusto Mendonça e Julio Camargo. Esse último principal acusador do presidente da Câmara. “Relevante notar que um dos atos que antecedeu as investidas contra Catta Preta foi justamente a oitiva que Julio Camargo realizada no dia 10 de junho de 2015, no qual revela que Eduardo Cunha foi uma dos beneficiários da propina paga em razão da aquisição dos navios-sonda da Samsung”, defende a PGR.
Empresa de espionagem
A Câmara dos Deputados assinou um contrato sigiloso por 5 anos com a empresa de investigação Kroll no valor de mais de R$ 1 milhão com a missão de investigar durante a CPI da Petrobras as pessoas que fizeram acordo de colaboração premiada na Lava Jato como o lobista Julio Camargo, conforme revelado por ÉPOCA em julho. “Chama a atenção o fato de nenhum político ter sido incluído na lista e 75% dos alvos serem colaboradores da Justiça”, diz a PGR. Além disso, o relatório final entregue pela Kroll para a CPI da Petrobras, cujo presidente foi o deputado Hugo Motta (PMDB-PB), aliado de Cunha, contém trechos copiados da Internet e de matérias jornalísticas, e não informações de inteligência, segundo ÉPOCA revelou. O MPF solicitou acesso ao material. Porém, Motta indeferiu, alegando que o conteúdo era restrito. Após a insistência dos investigadores, o presidente da Câmara enviou o trabalho assinado pela Kroll. “Esse episódio reforça os outros fatos já elencados, no sentido de que a CPI da Petrobras vem servindo a fins distintos daqueles para os quais foi criada”, diz a PGR. A atuação da empresa de investigação na CPI da Petrobras está sendo investigada pelo MPF.
Retaliação a inimigos
Após a divulgação de que Eduardo Cunha seria autor de requerimentos em nome de terceiros utilizados para achacar inimigos, o diretor do Centro de Informática da Câmara dos Deputados, Luiz Antônio Sousa da Eira, foi demitido. Além do servidor exonerado, o líder do PSOL na Câmara, Chico Alencar, apresentou à PGR uma reclamação segundo a qual membros da bancada estariam sendo achados por Cunha, pois apresentaram pedido de cassação do parlamentar. Cunha, irritado, teria partido para cima de seus inimigos. O seu colega Paulinho da Força (SD-SP) representou contra Alencar no Conselho de Ética. “Imediatamente posterior à representação (feita em 13 de novembro de 2015), houve representações contra os Deputados Federais JEAN WYLLYS e CHICO ALENCAR, respectivamente, Vice Líder e Líder do PSOL na Câmara dos Deputado. Também houve retaliação contra o Deputado GLAUBER BRAGA, que também assinou a representação, pois um requerimento feito em maio foi despachado pela Mesa Diretora na primeira semana de novembro, ou seja, após a representação”, diz o documento da PGR.
A propina no FI-FGTS
Uma das provas usadas pela PGR trata da cobrança de propina no FI-FGTS, como foi revelado por ÉPOCA. A Justiça do Rio enviou uma anotação obtida na operação Alcatéia. Registra-se uma verba de R$ 600 milhões e um honorário de 3% para Eduardo Cunha: R$ 20 mil mensais.
As contas no exterior
Embora Cunha afirme que nunca teve conta na Suíça, a investigação descobriu uma farta documentação sobre os valores. Há, inclusive, papeis encontrados papeis na residência oficial e na casa de Cunha no Rio, na operação realizada pela PF na última terça-feira. Um dos documentos encontrados na casa do deputado é de uma academia nos Estados Unidos, bancada com dinheiro escondido na Suíça. Há valores inéditos, ligados ao empresário Lúcio Funaro e outras empresas, que somam R$ 15 milhões e gastos de R$ 28.298.092,79
O Ministério da Ciência e Tecnologia
Cunha conseguiu emplacar, com o aval da presidente Dilma, o ministro de Ciência e Tecnologia, Celso Pansera. Na casa de Cunha, a PF obteve indícios da cobrança de valores. Assim dizia o manuscrito pego pela PF: “Min. Ciência e Tecnologia 700.000”.
Conselho de Ética e Fausto Pinato
No pedido, a PGR também cita ameaças e ofertas de propina ao ex-relator do processo de cassação no Conselho de Ética, deputado Fausto Pinato. Segundo a PGR, Cunha dificulta o esclarecimento dos fatos e opera uma série de manobras no Conselho com objetivo de escolher o foro em que será julgado criminalmente. “Ao alijar uma destas forças de trabalho, certamente, Eduardo Cunha está contribuindo diretamente para dificultar o esclarecimento dos fatos investigados”. Cunha tinha dois boletins de ocorrência sobre o deputado Pinato, que votou pela abertura do processo cassação dele. Trata-se da queixa de ameaça que Pinato diz que recebeu _ o outro seria para prejudicar o deputado. Um dos boletins eles estava no paletó do deputado quando houve a operação da PF na terça-feira.
Léo Pinheiro
A Procuradoria aponta diálogos em que Eduardo Cunha negocia a criação de emendas para beneficiar a empreiteira OAS, de Léo Pinheiro. Uma troca de mensagens entre Cunha e Manuel Ribeiro Filho, então diretor operacional da OAS Bahia, mostra essas negociações, envolvendo pagamento de "bônus". Muitas dessas emendas eram escritas pelas próprias empreiteiras e encaminhadas a Cunha, que escolhia um deputado aliado para apresentar as emendas, evitando assim que o nome do peemedebista fosse divulgado. Duas delas foram apresentadas pelo ex-deputado Sandro Mabel (PMDB-GO). As emendas, completamente distintas do tema original da MP, visavam ampliar formas de parcelamento de tributos para as empreiteiras. Segundo a procuradoria, Manuel Ribeiro Filho era o responsável por elaborar os projetos e medidas
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